* Crase

Crase é a fusão de dois ou mais sons iguais em um só. Aborda-se aqui a que se indica com o acento grave ( ` ) e que resulta da fusão de dois aa, escritos à(s).

O primeiro desses aa é sempre a preposição a. Esta ocorre quando presentes na frase palavras que a requerem. Palavras como: dirigir-se a, falar a, ir a, referir-se a, retornar a (verbos); alusão a, amor a, combate a, menção a, referência a, respeito a (substantivos); igual a, ligado a, semelhante a, similar a (adjetivos); anteriormente a, próximo a, quanto a, relativamente a (advérbios).

 

Já o segundo a da crase pode ser:

 

a) o artigo definido feminino a(s), o que significa que somente substantivos do gênero feminino (estejam expressos ou implícitos) admitem a crase:

Os deputados retornaram à sessão imediatamente. Expressemos o amor à Pátria e o respeito às leis.

 

b) o a inicial do pronome relativo a qual, as quais :

Esta é a emenda à qual se acrescentou um parágrafo. Trata-se das pessoas às quais devemos nossas vidas.

 

c)  o pronome demonstrativo feminino a(s), equivalente a “aquela(s)”:

Esta emenda é semelhante à que foi apresentada ontem.

Nossa sorte está ligada à do Brasil.

Às que muito reclamavam pediu paciência.

 

Observação: Um recurso prático para saber se há ou não a crase nos três casos acima consiste em substituir a expressão feminina por uma masculina: se o masculino resultar em ao(s), a crase se confirma. Cp.: Os deputados retornaram ao plenário imediatamente; Expressemos o amor ao País e o respeito aos regulamentos; Este é o projeto ao qual se acrescentou um parágrafo; Trata-se dos heróis aos quais devemos nossas vidas; Este parecer é semelhante ao que foi apresentado ontem; Nosso destino está ligado ao do Brasil; Aos que muito reclamavam pediu paciência .

 

d)  o a inicial dos demonstrativos aquele(s), aquela(s), aquilo :

Encaminhe-se àquele balcão. Foste àquela reunião?

Evite dar ouvidos àquilo.

 

Observação: Aqui, na dúvida, deve-se substituir o pronome por outro que não comece por a. Se aparecer um a, a preposição se confirma. Cp.: Encaminhe-se a este balcão; Foste a que reunião?; Evite dar ouvidos a isto.

Deve-se, ainda, usar o acento de crase nos seguintes casos (trata-se de casos particulares que não deixam de enquadrar-se nas regras acima):

 

a. Nas locuções formadas de palavras femininas:                                          

O povo ficou na praça à espera (à mercê / à disposição / à procura) do Presidente da República.

O trabalho foi feito às pressas (às carreiras / às escondidas / à risca).

Chegaram a Brasília às 14 horas (à tarde / à meia-noite / à toa).

À medida que (À proporção que) o tempo passava, mais impacientes ficávamos.

O soldado à paisana foi levado à força pelo policial militar.

 

Observação: A rigor, não existe o artigo feminino em locuções adverbiais de modo e de instrumento tais como à bala, à caneta, à faca, à força, à máquina, à míngua, à vista, etc., o que fica patente quando se troca o substantivo feminino por equivalente masculino (o artigo masculino não aparece). Cp.: Foi morto à bala / Foi morto a pau; Escrito à caneta / Escrito a lápis; Comprou à vista / Comprou a prazo. Foi o uso que consolidou o emprego do acento grave nessas locuções.

 

b. Diante de topônimos (nomes de lugar) que pedem o artigo feminino:

Faremos uma excursão à Bahia, a Sergipe, a Alagoas e à Paraíba.

Um túnel ferroviário liga a França à Inglaterra.


Observações

 

1.  Para saber se o topônimo pede ou não o artigo, deve-se trocar a preposição a por de ou em. Caso o resultado seja da e na, o artigo se confirma. Observe-se: Fui à Bahia. / Estou na Bahia. Mas: Fui a Sergipe. / Estou em Sergipe. / Voltei de Sergipe.

 

2  Topônimos que não admitem o artigo passam a exigi-lo quando especificados, ocorrendo então a crase. Cp.: Viajamos a Brasília, depois fomos  a São Paulo. / Viajamos à Brasília de Juscelino, depois fomos à São Paulo da garoa.

 

c. Quando a expressão à moda de (ou à maneira de) estiver subentendida:

Tinha estilo tão rebuscado, que todos diziam que escrevia à Rui Barbosa.

 

d. Diante das palavras casa e distância, quando especificadas

O bom filho volta à casa dos pais todos os dias. (Mas: O bom filho volta a casa todos os dias.)

Via-se um barco à distância de cem metros. (Mas: Via-se um barco a distância.)

 

Observação: Tratando-se  de Casa, sinônimo de Câmara dos Deputados, ocorrerá a crase: Prestar à Casa as devidas homenagens.


e. Diante da palavra terra, quando significa “solo”, “planeta que habitamos”, “lugar de nascimento ou onde se vive”.


O agricultor dedica-se à terra.

Quando os astronautas voltarão à Terra? Viajou em visita à terra dos antepassados.


Observação: Não há crase quando a palavra terra está em contraposição a bordo: Os marinheiros voltaram a terra depois de um mês no mar.

 

f. Na locução à uma “unanimemente, conjuntamente” e diante do numeral uma, quando em referência a hora:

Os sindicalistas responderam à uma: greve já! O avião aterrissou pontualmente à uma hora.

 

CASOS EM QUE NÃO OCORRE CRASE

 

Como, conforme já referido, são necessários dois aa para haver a crase, esta não ocorrerá:

 

a. Se houver apenas o artigo a(s):

O brasileiro aprendeu a lição: é preciso paciência para enfrentar a crise.

É preciso amar a Pátria e respeitar as leis.

O homem e a mulher, a qual era inocente, foram levados presos.

 

b. Quando já houver preposição:


Ficamos esperando-o desde (após / durante) as 7 horas. Calou-se ante (perante / com) a advertência.

Enviou flores para (mediante) as secretárias.

 

c. Se houver apenas o pronome demonstrativo a(s) ou apenas os pronomes aquele(s), aquela(s), aquilo :


Auxiliava tanto as pessoas ricas como as pobres.

O Presidente cumprimentou aquele secretário apenas. Ele disse aquilo sem pensar.


d. Diante de palavras masculinas (de d em diante, o a é apenas preposição):


Os projetos em discussão estão subordinados a turno único. Chegou a tempo de tomar o avião.

e.  Diante de verbos:

Estamos dispostos a vir e a trabalhar. Demorou a chegar, mas não tardou a sair.

 

f. Quando o a, sozinho, antecede palavra no plural (neste caso, não há artigo definido, pois o substantivo é empregado com sentido indeterminado):


A atuação do administrador está sempre sujeita a restrições. (cp.: ...às restrições da lei.)

Não dê atenção a intrigas. (cp.: ...às intrigas dos opositores.)

 

g. Diante do artigo indefinido uma, ou quando ele puder ser subentendido:


O funcionário entregou o ofício a uma pessoa indevida. Chegaremos ao Rio a uma hora qualquer, entre 19 horas e 21 horas.

Foi submetido a cirurgia delicada.

 

h.  Entre palavras repetidas, ainda que do gênero feminino:

cara a cara, frente a frente, gota a gota, de lado a lado.


i. Diante de pronomes de tratamento, pessoais, indefinidos, relativos quem e cuja e os demonstrativos esta e essa:

 

Fizemos referência a Vossa Excelência (a Sua Excelência / a

Vossa Eminência / a Sua Santidade, a você).

Não entregaste a mim (a ela) o documento.

Contou a verdade a certa (a qualquer / a cada / a toda) pessoa.

Cederemos o espaço a esta (a essa) empresa. Não sei a quem recorrer.

A reunião a cuja pauta me referi foi cancelada.


Observação: Os pronomes de tratamento senhora, senhorita, madame e dona (este, especificado) e o indefinido outra admitem o artigo, ocorrendo a crase: Desejo felicidade à senhora e à Dona Carmélia; As pessoas perguntavam-se umas às outras quando findaria aquele pesadelo.

 

j. Antes de Nossa Senhora e de nomes de santas:

Nas suas aflições, apelava a Nossa Senhora e a Santa Bárbara.

 

CRASE FACULTATIVA

 

Emprega-se facultativamente o acento de crase quando é opcional o uso da preposição a, caso da letra a abaixo, ou do artigo definido feminino, caso das letras b, c, d.

 

Casos em que a crase é facultativa:

 

a. Depois da preposição até:

O visitante foi até à / a sala do Diretor.

A sessão prolongou-se até à / a meia-noite.

 

b.   Diante de pronome possessivo feminino acompanhado de substantivo:


No discurso de ontem, limitou-se à / a sua pregação de sempre.

Fizeram ameaças à / a minha secretária.

 

Observações

 

1. Diante de possessivo feminino no plural, é preciso atenção. Pode-se escrever Fizeram ameaças às minhas secretárias ou Fizeram ameaças a minhas secretárias , mas não * Fizeram ameaças à minhas secretárias 

. Na primeira frase, o acento de crase é obrigatório porque, além da preposição a, exigida pelo substantivo ameaça, usou-se o artigo as, indicado pelo s de às. Já na segunda, o acento de crase não é possível, pois não se usou o artigo, mas apenas a preposição. Essa, aliás, é a razão por que a terceira frase está errada: ali há somente um a, logo não há crase.

2. Nos casos em que o possessivo feminino está ocupando o lugar do substantivo, o acento de crase é obrigatório, pois a presença do artigo torna-se necessária. Observe-se: (A) sua roupa é nova, a minha é usada. Como o primeiro possessivo está acompanhado de substantivo, pode-se usar ou não artigo antes dele, ao passo que antes do segundo, que está só, fazendo as vezes do substantivo, o uso do artigo é obrigatório. Por essa razão, quando houver a preposição a, haverá a crase: Refiro-me a (ou à) sua roupa, não à minha. Compare-se com o masculino, para confirmar: Refiro- me a (ou ao) seu traje, não ao meu.

 

c.     Diante de nomes próprios femininos (o uso do artigo antes de substantivos próprios personativos é variável conforme a região ou a intimidade com a pessoa):

Em suas dificuldades, sempre recorria à / a Júlia. Jacó preferia Raquel à / a Lia.


Observação: Tratando-se de pessoa célebre com a qual não se tenha intimidade, geralmente não se usa o artigo nem, consequentemente, o acento de crase, salvo nos casos em que o nome está acompanhado de especificativo. Cp.: O orador fez uma bela homenagem a Rachel de Queiroz. / O orador fez uma bela homenagem à Rachel de Queiroz de O quinze.

 

d. Quando é indiferente usar ou não artigo diante do substantivo:


Todo trabalhador tem direito à / a aposentadoria. (cp.: Todo trabalhador tem direito a / ao repouso remunerado.)

 

* Manual de Redação da Câmara dos Deputados  (2004)


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